Nunca fui fã de poesia. Nunca fez muito sentido para mim - e continua não fazendo (ainda prefiro os romances, livros científicos e históricos). Acho que deve ser um trauma com a disciplina de literatura que tinha na época do ensino médio e científico (naquele tempo ainda se referia assim). Tenho pesadelos até hoje com o "eu lírico" ~~. Todavia, por incrível que pareça, eu lia bastante Drummond de Andrade e Gregório de Matos (O Boca do Inferno) - o primeiro era meu favorito. O tempo foi passando e a poesia se perdeu para mim. Não obstante...
Recebo de "presente", ontem, um livro de poesia de meu progenitor (vulgo, pai). Segundo ele, eu estava lendo muita poesia recentemente e ele achou que eu gostaria do livro. Fora o engano absurdo da primeira hipótese (como já mencionei e acrescento alguns números - não leio poesia há pelo menos 10 anos), ele, talvez, não tenha se enganado sobre a segunda possibilidade - uma surpresa também. Ganhei o seguinte livro:
Sim, Paulo Leminski. Confesso que somente o conhecia por postagens (prontas) de pessoas (não todas, lógico) que nem sabiam que ele era brasileiro, natural de Curitiba e dono de um extensa obra literária (se duvidar, não entenderiam ainda a capa do livro). E o que me levou a voltar a ler poesia? Bom, além de ganhar o livro, há outros motivos que somente serão conhecidos nas entrelinhas dos versos vindouros.
Mas o que quero dizer nessa postagem é que, embora a maioria sejam frases soltas (para mim), muitas poesias parecem que foram escritas olhando para dentro de nossos olhos (corações, fique a vontade em sua escolha). Mas pare para pensar: nós "escutamos" poesias todos os dias! Música (nem todas, naturalmente) é, inclusive, poesia (cantada). Cito aqui uma música (poesia?) de uma de minhas bandas prediletas, o Móveis Coloniais de Acaju, da canção "O Tempo":
O meu futuro é esperar pelo presente de fazer
O tempo engatinhar
Do jeito que sempre quis
Distante é devagar
Perto passa bem depressa assim
Alguém mais culto poderia argumentar que estou blasfemando. Contudo, assim como o trecho dessa música não é nem um pouco poesia para outrem, Leminski não me convence em muito do que escreveu (e do que li até agora). Mas destaco algumas que li de Quarenta Clics em Curitiba:
Para mais de um sonho
--
Depois de hoje
a vida não vai mais ser a mesma
a menos que eu insista em me enganar
aliás
depois de ontem também foi assim
anteontem
antes
amanhã
--
este dia
este perverso dia
que veio depois de ontem
Fez muito sentido para mim. E, embora poucas, elas me instigaram a continuar a ler o livro e aqui deixo a recomendação, não somente a Leminski, Drummond ou Gregório, mas a ler poesia em geral. Ah, e para incentivar mais ainda, deixo aqui uma clássica poesia e outra, uma de minhas prediletas, de Carlos Drummond de Andrade:
No meio do caminho havia uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra.
--
Convite triste
Meu amigo, vamos sofrer,
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema
ou qualquer outra besteira.
Fitar por exemplo uma estrela
por muito tempo, muito tempo
e dar um suspiro fundo
ou qualquer outra besteira.
Vamos beber uísque, vamos
beber cerveja preta e barata,
beber, gritar e morrer,
ou, quem sabe? beber apenas.
Vamos xingar a mulher,
que está envenenando a vida
com seus olhos e suas mãos
e o corpo que tem dois seios
e tem um embigo também.
Meu amigo, vamos xingar
o corpo e tudo que é dele
e que nunca será alma.
Meu amigo, vamos cantar,
vamos chorar de mansinho
e ouvir muita vitrola,
depois embriagados vamos
beber mais outros sequestros
(o olhar obsceno e a mão idiota)
depois vomitar e cair
e dormir.
Bom, Drummond, não tenho uísque, cerveja preta ou uma velha vitrola. Mas agora posso oferecer uma boa cachaça e Johnny Cash.
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